Rito Escocês Antigo e Aceito

 

 

RITO ESCOCÊS ANTIGO E ACEITO

 

ORIGENS DO RITO ESCOCÊS ANTIGO E ACEITO

"Trabalho colocado em observações próprias do autor e na conferência realizada no Subl.’. Capítulo L'Amitié (Amizade) em Lousanne em 5-5-1923 pelo Ir.’. Mourice Joton 30º."

            A influência das Cruzadas devia fazer-se sentir, não só entre os artífices mas ainda entre os nobres que também conheceram na Palestina, formas de associações novas e, uma vez de volta a Europa constituíram Ordens, semelhantes às do Oriente, nas quais admitiram logo outros iniciados. É assim que em 1196, fundou-se na Escócia a "Ordem dos Cavaleiros do Oriente", cujos membros tinham como ornamento uma cruz entrelaçada por quatro rosas.  

             Dizem que essa Ordem trazida da Terra Senta, pelo ano de 1188 da Era Cristã, da qual o rei Eduardo I da Inglaterra, (1239-1307), veio a fazer parte dela.

            Um século após a fundação da Ordem dos Cavaleiros do Oriente, ou seja pelo ano de 1300, em seguida a última Cruzada em que também tomara parte o rei de uma Ordem estabelecida no Monte Moria, na Palestina (lugar escolhido por Salomão para a construção do seu Templo), fundaram um Capítulo dessa mesma Ordem, fixando-lhe a sede dos Hébridas, e mais tarde em Kilwinning, denominando essa Ordem de "Ordem de Heredon" (lembramos que a palavra "Heredon" e composta de "hieros"- santo e "domos"- casa, portanto Casa Santa ou Templo).
            Alguns anos mais tarde, no começo do século XIV, o papa Clemente V e o rei da França, Felipe o Belo, iniciaram sua obra nefasta de perseguição contra os Templários.
Para se compreender o papel que a Ordem do Templo desempenhou na Maçonaria Escocesa é necessário resumir sua história.

            A Ordem do Templo foi fundada após a primeira Cruzada, por Godofredo de Bouillon, Hugues de Payens e Godofredo de Saint-Omar, com o fito de proteger os peregrinos que de Jerusalém se dirigiam ao lago de Tiberiade. Associados em 1118, à outras sete Cavaleiros, os Templários fizeram seu quartel numa casa vizinha ao terreno do Templo de Jerusalém. Dez anos mais tarde receberam do papa, os estatutos que os constituíram em Ordem, ao mesmo tempo Religiosa e Militar.

            Em breve essa Ordem tomou um desenvolvimento considerável, que no século XII, possuía nove mil residências na Europa. No século XIV, contava com mais de vinte mil membros. Apesar do seu poder e da sua riqueza, o mistério que os Templários cercavam as reuniões de seu Capítulo e de suas iniciações e, prestava-se as acusações de impiedade e de crueldade que o vulgo em todos os tempos proferiu contra as associações secretas.
             Consciente de uma impopularidade crescente o Grão-Mestre Jacques de Molay, pediu ao papa Clemente V, em 1306, a abertura de um inquérito, mas este contentou-se a convidar Molay a ir a Avignon, na França, onde, por força de circunstâncias adversas estava, provisoriamente instalado o papado.

            Por outro lado o rei da França tinha mais do que nunca necessidade de dinheiro, e para resolver esta dificuldade valia-se dos Templários que lhe emprestavam elevadas somas. Ora, naquele tempo, quando alguém queria se desembaraçar de uma dívida, o meio mais simples era desembaraçar-se do credor. Foi por isso que em setembro de 1307, todos os oficiais do rei receberam instruções mais que misteriosas, sendo que a 12 de setembro do mesmo ano Molay era preso no Templo, ao mesmo tempo que outros membros da Ordem também o eram, em todos os pontos da França. No mesmo dia todos foram levados perante inquisitores, que os acusaram dos mais abomináveis crimes, e como não podiam confessar um crime que não cometeram, foram levados a tortura. Disse um deles a seus juizes: - Fui de tal modo torturado, atormentado, exposto a força que as carnes dos meus calcanhares foram consumidas, que os ossos caíram poucos dias depois.

            O Rei, Felipe o Belo, apresou-se em fazer mão baixa no tesouro da Ordem, depositado no Templo de Paris. O concílio que deveria julgar os Templários reuniu-se em Viena, no Delfinado à 13 de outubro de 1311, onde ninguém foi citado para defender-se. Porém diante da resistência do concílio em julgar tal iniquidade, o papa, Clemente V, cassou a autoridade da Ordem do Templo em 12 de abril de 1312, quando os concílios de Ravena, Salamanca e Moguncia tinham absolvido os Templários, sendo estes levados a sua presença.
            A supressão da Ordem dos Templários teve seu epílogo em 1313. O papa reservara para si o julgamento do Grão-Mestre e dos dignitários presos a sete anos, nas masmorras de Felipe o Belo. A 18 de março de 1313 todos se retrataram e na noite daquele mesmo dia todos pereceram nas fogueiras, que com antecedência haviam sido preparadas. Prevaleceu a força e o interesse sobre a justiça. A última frase de Jacques de Molay foi: - "Spes mea in Deo est".  

            Esta frase tornou-se uma divisa para o Grau 32 do Rito Escocês Antigo e Aceito.
É muito provável que os sobreviventes da Ordem dos Templários, anatematizados pela igreja, tenham então procurado agrupar-se de novo em outras associações, sendo que não há razões plausíveis para aceitar como fato histórico, nem repeli-las, a titulo de lenda, a tradição maçônica que liga a tradição que praticaram os Templários, a Ordem Cavalheiresca de Heredom, ou ao Grande Capítulo de Kilwinning. Entretanto desde que começaram as perseguições na França, vários templários escaparam, por felicidade, fugindo para a Escócia, e alistaram-se sob a bandeira do Rei Roberto I, que criou a 24 de junho de 1334, a "Ordem do Cardo", em favor dos maçons e dos Templários que haviam contribuído para o sucesso de suas armas em Bannock-Bum, na qual as recepções eram semelhantes as da Ordem do Templo.
             Parece pois que, o rei da Inglaterra quis recompensar os Templários, restabelecendo sua Ordem, com as suas formas, mas com outra designação. Há outro fato mais importante ainda, um ano depois, Roberto I, fez a fusão da Ordem do Cardo com a Ordem de Heredom e elevou a Loja Mãe de Kilwinning a categoria de Loja Real e, estabeleceu junto a ela o Grande Capítulo da Ordem Real de Heredon de Kilwinning e dos Cavaleiros Rosa-Cruz. Este nome de Cavaleiro Rosa Cruz aparece aqui pela primeira vez, fazendo, tudo supor, que não é senão outra designação da Ordem dos Cavaleiros do Oriente, cujo emblema era uma cruz enlaçada por quatro rosas.
            Estes fatos históricos são de importância capital para o Escocismo e pedem mais atenção para o assunto. Verificamos em primeiro lugar, que nos séculos XII e XIII, a Maçonaria Operativa viu abrigarem-se nas sua Lojas, Ordens de Cavalaria que nenhuma relação tinham com aquela associação de ofício, e cujas iniciações, praticas, cerimônias e graus eram diferentes dos seus. Algumas dessas Ordens, se refugiavam na nova Ordem estabelecida pelo rei Roberto I, por si próprias, outras pelo beneplácito dos reis da Inglaterra, que acumulavam dos mesmos favores, à maçons e cavaleiros, em recompensa aos serviços prestados à coroa, e os agrupava em uma fraternidade, sobre a qual podiam apoiar-se, em caso de necessidade.
            Uma outra constatação importante para o escocismo, é que os Templários, desde 1307, penetravam nas Lojas da Escócia, que estavam sob a égide da Ordem do Cardo, levando não obstante as cerimônias Templárias e seus graus. Estes graus junto aos outros da Ordem da Cavalaria eram conferidos pelo Grande Capítulo Real de Heredom de Kilwinning, e formavam o sistema escocês, conhecido pelo nome de Rito de Heredom ou de Perfeição. Pode-se assim explicar como, após a suspensão da Ordem do Templo, certas Ordens de Cavalaria, que haviam mantido sua influência sobre a maçonaria operativa da Escócia, acharem o meio de desenvolverem o cerimonial das iniciações dos pedreiros, num ritual completo e suscetível de incultar aos seus iniciados mais do que a simples comunicação dos segredos da arte de construir.
            É também por essa época, ou seja mais de quatrocentos anos antes da constituição da Grande Loja da Inglaterra, que se viu nascer na Escócia o nome de Maçom Adotado, pelo qual entenderam os membros das Lojas que não pertenciam a profissão de pedreiros. Insistamos em que essa fusão da Maçonaria operativa com as Ordens da Cavalaria, se operou somente na Escócia, mas não na Inglaterra. Isto explica portanto, a origem escocesa dos graus, outros, que não eram conferidos pela corporação dos pedreiros de outros países - aprendiz, companheiro e mestre.
            Enfim, realcemos o papel político das Ordens da Cavalaria e das Lojas da Escócia, inteiramente devotados ao rei da Inglaterra, compreenderemos então a fidelidade que a Maçonaria Escocesa defendia a causa dos destronados.
            Para terminar esta parte deste trabalho, é interessante notar quais os graus que a Loja Real de Kilwinning e seu Grande Capítulo de Heredon conferiam desde o seu estabelecimento. A própria Loja trabalhava com os graus da Maçonaria operativa, ou sejam Aprendiz, Companheiro e Mestre de ofício, mas convém notar que o Grau de Mestre não existia naquela época em que os mestres não eram senão os dirigentes das Oficinas, isto é das construções, cada qual em sua profissão.
            Os demais graus inspirados pelos Rosa-Cruz, foram criados no começo do século XVIII, quando o Capítulo de Heredon, conferia aos membros da Ordem dos Cavaleiros do Oriente ou Ordem dos Cavaleiros Rosa-Cruz, e a Ordem do Cordo, ou do Templo, todos os graus dessas duas Ordens. Depois de haver assim, brevemente resumido as tradições da confraria dos pedreiros e estabelecido, em conseqüência de circunstâncias, as Ordens da Cavalaria a elas se ligaram.
             Convém deter-nos um instante na Ordem da Rosa-Cruz, que exerceu uma influência preponderante na transformação da Maçonaria Operativa na sua forma Simbólica, como a conhecemos hoje. Poucos historiadores se ocuparam da real origem da Rosa-Cruz, que entretanto desempenhou papel considerável nos séculos XVI e XVII. O motivo dessa abstenção, se explica pela ausência da necessária documentação história que os Rosa-Cruz não se preocuparam em guardar, pois viveram espalhados pelo mundo, conhecido então, reunindo-se uma vez por ano para transmitir, uns aos outros, os conhecimentos adquiridos, porem estes conhecimentos sempre foram transmitidos verbalmente.
            A Conferência Internacional dos Cavaleiros Rosa-Cruz, realizada em Bruxelas em 1880, felizmente lançou uma nova luz sobre a história dessa Ordem.
            A princípio a conjuração dos Rosa-Cruz, não foi mais do que uma afirmação da liberdade de pensar. Uma obra de apaziguamento e de tolerância. O que os Templários tinham querido fazer no seio da Igreja Romana, os Rosa-Cruz também tentaram realizar, porém ficando cautelosamente fora de qualquer afirmação confessional.
             Passados quase quinhentos anos, desde que os Templários remanescentes do massacre ordenado por Clemente V, se estabeleceram na Escócia, durante os quais o Escocismo se consolidou e se espalhou pela Europa, é que vamos encontrar nos novos registros das mudanças estabelecidas no Escocismo, tal qual o conhecemos hoje. É conveniente lembrar, que o poder diretivo da Ordem não mais estava na Escócia nem na França, mas sim na Prússia, onde Frederico II, seu rei, havia efetivado profundas modificações no Escocismo, fazendo vigorar a primeira Constituição, Regulamentos e Leis normalizando o Escocismo. Uma dessas mudanças foi a de dar ao Escocismo os atuais trinta e três graus, pois até então somente tinha vinte e cinco.
            As grandes Constituições de 1786 não chegaram a realizar imediatamente o fim a que se haviam proposto, e é fácil determinar a causa. Três meses depois de serem publicadas em 17 de agosto de 1786, Frederico II, seu autor, morreu. Todos que, com Frederico II, compuseram o primeiro Conselho da Ordem, reestruturada, foram obrigados a se dispersar, premidos pelo novo rei Frederico Guilherme II, que só queria a Ordem Rosa-Cruz e passou a não tolerar outra forma de Maçonaria.
            Deste modo a reforma foi levada para a França, por um dos colaboradores de Frederico II, o conde D'Esterno, embaixador da França em Berlim, e um dos signatários das Grandes Constituições. D'Esterno, tentou introduzir, desde o seu regresso, o Rito Escocês Antigo e Aceito em seu país, fundando para isso um Supremo Conselho, em Paris, em cuja presidência ficou o duque de Orleans e do qual tomaram parte Chaítlon de Joinville, o Conde de Clermont-Tonnerre e o Marquês de Bercy. Este Supremo Conselho teve vida efêmera, sendo obrigado a desaparecer pelas circunstâncias revolucionárias que se estabeleceram na Franca.
Há um fato curioso à ser registrado. O Escocismo, havia sido fundado na Europa, onde adormeceu, e voltou a funcionar mais tarde, voltando da América de uma forma mais vigorosa e mais envolvente, pelas seguintes razões.
            A 27 de agosto de 1761, o Conselho dos Imperadores do Oriente e do Ocidente havia entregue ao Irmão Estevão Morin cujos negócios o chamavam à América, uma Patente de Grão-Mestre Inspetor, autorizando-o a "Trabalhar regularmente pelo próprio proveito e adiantamento da Arte Real e constituir Irmãos nos Sublimes Graus de Perfeição". Morin, saindo de Paris, chegou a São Domingos onde instalou o seu gabinete, espécie de Grande Oriente para os Altos Graus no Novo Mundo. Em 1770, fundou o Conselho dos Príncipes do Real Segredo de Kingston, na Jamaica, criou muitos Inspetores Gerais, entre eles, Francken, De Grasse-Tilly, De la Hogue e Hacquest.
            Ora, esses Maçons da América, pertenciam ao Rito de Perfeição, mantinham assíduas relações com o Grande Consistório de Bordeaux. Mas, como já foi dito este adormece em 1781. Desde então os novos Corpos de São Domingos e da Jamaica passam a manter relações com Berlim até a morte de Frederico II, que era tido como o Grão-Mestre Universal. É provável entretanto que não podendo mais prevalecerem-se de Atos Constitucionais emanados de uma autoridade desaparecida, aqueles maçons dirigiram-se a Berlim tendo em vista agruparem-se sob outro sistema, e ligaram-se em definitivo ao Rito constituído pelas Grandes Constituições.
            A 29 de novembro de 1785, Salomão Bush, Grão-Mestre de todas as Lojas e Capítulos da América do Norte, dirige-se a Frederico II na sua qualidade de chefe supremo da Maçonaria para dar-lhe a conhecer a criação, em presença de uma grande assembléia de Irmãos, de uma "Sublime Loja" em Philadelphia, que "se submeteria as Leis e Constituições que a Ordem deve ao seu Chefe Soberano", e exprime o desejo de que a "Grande Luz de Berlim condescenderá em iluminar a nova Loja". Não obstante, os maçons da América trabalham até 1801 com o Rito de Perfeição, pois até aquela data o mais alto grau conhecido na América era o de Príncipe do Real Segredo, ou seja o Grau 25, na escala do Escocismo, antes da reforma estabelecido por Frederico II, que lhe acrescentou mais sete graus.
            A 31 de maio do mesmo ano, foi constituída em Charleston uma nova Potência dirigente que adota as Grandes Constituições de 1786 e os trinta e três Graus nelas estabelecidas. Essa Potência que tomou o nome de "Supremo Conselho dos Grande Inspetores Gerais para os Estados Unidos da América", foi realmente o primeiro a realizar de modo definitivo o objetivo das Grandes Constituições de Frederico II, ou seja, a primeira a praticar o Escocismo como é hoje conhecido. De Grasse-Tilly, era membro do Supremo Conselho de Charleston. Em 1802 voltou à Jamaica e fundou com De La Houge naquela cidade, um Supremo Conselho de qual foi o Mui Poderoso Soberano Grande Comendador. Em 1803, De Grasse-Tilly regressou à França onde instalou em 22 de setembro de 1804 um Supremo Conselho em Paris, com jurisdição internacional.
            Assim o Rito Escocês Antigo e Aceito e o Escocismo, renasciam de suas cinzas no solo francês, de onde não mais saiu, e achava-se definitivamente constituídos sobre as bases das Grandes Constituições. Sucessivamente foram fundados outros Supremos Conselhos em muitos países da Europa e na maior parte dos da América. Estes Supremos Conselhos formam hoje o Escocismo e o Rito Escocês Antigo e Aceito, que é o Rito maçônico mais praticado no mundo.
             Vamos parar por aqui este relato, porque todos acontecimentos posteriores a 1801, pertencem a história do Rito Escocês, em todas as suas formas, e o nosso propósito limita-se às suas origens.
            O Rito Escocês Antigo e Aceito terminou assim o período do seu estabelecimento; sua organização, o número e os nomes dos seus trinta e três graus, as regras que os regem, contudo o que é necessário, em suma, como fixação de um plano comum, que está felizmente considerado como definitivo. Desde então sua organização compreende uma série de seis grupos, a um tempo unidos e hierarquizados. A Loja Simbólica, a Loja de Perfeição, o Capítulo, o Conselho de Kadosch, o Consistório e o Supremo Conselho. O conjunto destes Corpos, formam uma Instituição na qual todos os elementos estão ligados entre si, e cujas categorias funcionam sem se oprimirem umas as outras, com uma harmonia feliz, pela integração de todos.
            Todos esses Corpos constituídos, independentemente uns dos outros, teem uma organização específica e uma hierarquia interna, direitos e deveres apropriados que as leis e usos de nosso rito determinam. Ora, essas leis não são mais do que leis de equilíbrio destinados a assegurar o funcionamento da sociedade inteira em perfeita ordem e harmonia. O Rito Escocês Antigo e Aceito representa os maçons que desde 1717, consideraram como incompleto o sistema da Grande Loja da Inglaterra; os que, durante o século XVIII, procuraram organizar em uma só serie as iniciações, que outrora era praticada nos colégios independentes.
            Enfim, o Rito Escocês Antigo e Aceito resolveu definitivamente o problema que tinha por objetivo conservar na Maçonaria os ensinamentos filosóficos que, há séculos, se agruparam em torno do pensamento primitivo e simples, em que a Maçonaria está estabelecida. Cada iniciação evoca a lembrança de uma religião, de uma escola, ou de alguma instituição da antigüidade. Estão em primeiro lugar as doutrinas judaicas. Vêem em seguida os ensinamentos baseados no cristianismo e representados sobretudo pelos Rosa-Cruz, esses audazes naturalistas que foram os pais do método de observação e procura da verdade, de onde saiu a ciência moderna. Portanto, as iniciações do Escocismo reportam-se aos Templários, esses cavaleiros hospitalares e filósofos nos quais os maçons dos Altos Graus glorificam a liberdade do pensamento corajosamente praticada numa época de terrorismo sacerdotal. O tempo terminou a sua obra. Doravante a prosperidade da Ordem dependerá em cada país dos Irmãos que a conduzem e a inspiram. A fidelidade absoluta depende da parte de todos os maçons dos Altos Graus, ao Estatuto Geral de cada Supremo Conselho e a convicção inquebrantável na excelência do Escocismo, são sem sombra de dúvida as condições necessárias para a perpetuação da Ordem, mas para esse desiderato é necessário que cada um de nós cumpra bem a sua parte.
             Acredito finalmente, ter podido mostrar com fidelidade as reais origens do Escocismo, como é praticado nos nossos dias.

A COR PÚRPURA DO
RITO ESCOCÊS ANTIGO E ACEITO

            A cor púrpura, principal do Rito Escocês Antigo e Aceito, é uma decorrência de suas origens mais remotas, no século XVII, na França, e da aristocratização que lhe foi imposta, a partir do segundo quartel do século XVIII, também na França. Na realidade, os primeiros agrupamentos maçônicos de feição moderna - dos maçons Aceitos - na França, surgiram na esteira do séquito dos Stuarts, a partir de 1649, quando Henriqueta de França, viuva do rei stuartista inglês Carlos I, que fora preso e decapitado após a vitória da revolução puritana de Oliver Crommwell, aceitava, do Rei-Sol, Luis XIV, asilo no castelo de Saint-Germain-en-Laye. E haveria um sensível aumento desses agrupamentos, a partir de 1688, quando da segunda queda dos Stuarts, com Jaime II, depois da restauração de 1660; nessa segunda queda, novamente, o asilo político seria em Saint-Germain, concedido pelo mesmo Luís XIV. Os Stuarts, que, a partir do século XIV, com Alan Fitzflaald, haviam ocupado os tronos da Escócia e da Inglaterra, eram reis católicos e os seus seguidores, os jacobitas, eram chamados de “escoceses”, por sua feição partidária stuartista e não pela sua origem nacional.

            Já com um grande contingente maçônico desse sistema “escocês”, na França, um cavalheiro escocês, André Michel de Ramsay, que havia sido corrido da Escócia, por querer implantar graus cavalheirescos na Maçonaria, produziu um discurso, em 1737, onde ele pretendia demonstrar o seu agradecimento, por ter passado de plebeu a nobre, depois de se tornar cavaleiro da Ordem de S. Lázaro. E nesse discurso --- que não lhe foi possível pronunciar, por proibição do cardeal Fleury, mas que foi publicado no ano seguinte --- ele procura ligar as origens da Franco-Maçonaria aos reis e príncipes das Cruzadas. Embora isso fosse apenas uma fantasia, o certo é que renderia frutos duradouros, a partir de 1758, quando foi fundado, em Paris, o Conselho dos Imperadores do Oriente e do Ocidente, ou Soberana Loja Escocesa de S. João de Jerusalem. A partir desse momento, o sistema se tornava aristocratizado --- como Rito de Héredom --- ganhando a América do Norte, onde teria a sua roupagem definitiva , a partir de 31 de maio de 1801, com a fundação, em Charleston --- por onde passa o paralelo 33 da Terra --- na Carolina do Sul, do primeiro Supremo Conselho do Rito Escocês dos Maçons Antigos e Aceitos.

            O que importa considerar, nesse apanhado bastante superficial dos primórdios do Rito, são os dois dados principais: 1. o Rito nasceu no catolicismo; 2. o Rito foi aristocratizado.

            O catolicismo possui cinco cores litúrgicas: branca, negra, verde, roxa e vermelha. Destas, a mais importante é a VERMELHA, que é a cor do sangue e o símbolo da efusão do sangue por amor; por isso é a cor dos mártires da Igreja, usada durante as celebrações em homenagem a esses mártires. Alem disso, ela é a cor que distingue a alta dignidade cardinalícia; os cardeais, que, na hierarquia mundana, correspondem aos príncipes, usam o chapéu --- ou solidéo --- vermelho e a faixa vermelha, como sinal de sua distinção.

            E a cor da nobreza, da realeza, também é a vermelha. Todos os antigos reinantes, ao assumir o trono, recebiam, sobre os ombros, um manto vermelho; famosa é a púrpura imperial, com que os imperadores romanos - os Césares - eram revestidos, quando de sua ascensão ao trono imperial. A própria púrpura cardinalícia, já referida, é um sinal de nobreza dos príncipes da Igreja.

             Estabelecida a origem da cor vermelha no Rito Escocês Antigo e Aceito, podemos, então, lançar os olhos sobre as instruções e resoluções do rito, antigas e modernas:

             Havendo necessidade, na segunda metade do século XIX, de tomar algumas medidas que tornassem consensual a prática do Rito Escocês Antigo e Aceito, inclusive no que se referia à cor do rito e aos aventais, embora estes, em todas as instruções anteriores, fossem orlados de vermelho, realizou-se em Lausanne, em 1875, um Congresso de Supremos Conselhos, que, em relação, especificamente, ao tema em pauta, resolveu:

1. O avental terá dimensão variável de 30/35 cm. por 40/45 cm. ;

2. O avental do Aprendiz Maçom é branco, de pele de carneiro, com abeta triangular levantada e sem nenhum enfeite;

3. O avental do Companheiro Maçom é branco, com a abeta triangular abaixada, podendo ter uma orla vermelha;

4. O avental do Mestre Maçom é branco, com a abeta triangular abaixada, orlado e forrado de vermelho, tendo, no meio, também em vermelho, as letras M e B;

5. O avental é o símbolo do trabalho e lembra, ao obreiro, que ele deve ter uma vida laboriosa;

6. A cor do Rito Escocês Antigo e Aceito é a vermelha.

            Alguns autores questionam as resoluções de Lausanne, porque este Congresso reuniu poucos participantes. Ora, como em qualquer sociedade, os ausentes, que deixam de atender ao chamamento, devem aceitar o que os presentes decidirem.

            Mas, alem disso, aí estão rituais e instruções anteriores e posteriores à Convenção de Lausanne, mostrando qual é, na realidade a cor do Rito. Para ficar só nos nacionais, podemos citar os seguintes trechos, de publicações anteriores a 1875:

            “As paredes do templo, cortinas, mesas, docel, etc., são forradas de encarnado no rito escossês e de azul nos ritos moderno e adoniramita; nestes dos últimos, os galões e franjas dos paramentos devem ser de prata ou de fazenda de cor branca, e no primeiro, de ouro” (Guia dos Maçons Escossezes, ou Reguladores dos Tres Graus Simbolicos do Rito Antigo e Aceito, do Grande Oriente Brazileiro - Rio de Janeiro - 1834 - página 46) --- os grifos são meus.

            “Grau 3o. - Fita azul orlada de escarlate a tiracollo da esquerda para a direita, suspensa em baixo a jóia, que é um esquadro e um compasso de ouro entrelaçados. A jóia pode ser cravejada de pedras. Avental branco de pele forrado e orlado de escarlate, com uma algibeira abaixo da abeta, sobre a qual estão bordadas as letras M.: B.:” (no mesmo Guia dos Maçons Escossezes, capítulo referente a insígnias e jóias - página 49) --- os grifos são meus.

            “O encarnado é o característico do escossismo” (Regulador Geral do Rito Escossez Antigo e Aceito para o Imperio do Brasil - Rio de Janeiro - 1857 - pág. 46) --- os grifos são meus. O mesmo regulador, na mesma página, para estabelecer as diferenças com os outros dois ritos então praticados no país, Moderno e Adoniramita, , destaca que, para esses ritos “o azul é o característico, razão porque são estes dos ritos chamados azues” (os grifos são meus). “A Loja é decorada com estofo ou tapeçaria encarnada” (Manual Maçonico ou Cobridor dos Ritos Escossez Antigo e Aceito e Francez ou Moderno - 4a. ed. - Rio de Janeiro - 1875 - pág. 1) --- os grifos são meus.

            “No Oriente há um docel de estofo encarnado com franjas de ouro” (no mesmo Manual Maçônico - pág. 2) --- os grifos são meus. “Avental branco, forrado e orlado de encarnado, com uma algibeira por baixo da abeta. No meio do avental estão pintadas ou bordadas em encarnado as letras M.: B.: (no mesmo Manual Maçônico - pág. 11) --- os grifos são meus.

            Como se pode ver, portanto, o Congresso de Lausanne não fixou novas regras; ele, apenas, regulamentou os costumes já vigentes, desde os primórdios do rito.

             Posterior a 1875, pode-se citar, pelo menos, uma publicação brasileira, que confirma a resolução de Lausanne:

            “Fita azul, orlada de escarlate, a tiracollo da esquerda para a direita, suspensa em baixo a jóia, que é um compasso e um esquadro de ouro entrelaçados. Avental branco de pele, forrado e orlado de escarlate com uma algibeira abaixo da abeta, sobre a qual estão bordadas as letras M.: B.: (Regulamento Geral da Ordem Maçônica no Brasil - Rio de Janeiro - 1902 - pag. 165, no capítulo que trata das insígnias e jóias do REAA) --- os grifos são meus.

            No caso específico do Brasil, o que se vê, hoje, dia, é a fuga às tradições e às origens do Rito Escocês, com a padronização de todos os paramentos de acordo com o Rito de York. Sim, pois aventais de orla azul, com roseta --- e de orla azul, com bolinhas de prata e níveis de metal para o Venerável Mestre --- são paramentos do Rito de York (Emulation)! Como isso surgiu, já foi exaustivamente explicado, em outras ocasiões.

            E a coisa chegou ao ponto de gerar situações absurdas, para não dizer ridículas, como a que me foi narrada por um querido amigo de Brasília: um candidato, funcionário do Ministério do Trabalho, foi iniciado e, logo depois, teve que cumprir missão na Itália, onde deveria permanecer, pelo menos, um ano, o que fez com que sua Loja autorizasse suas elevações em uma co-irmã italiana, também do Rito Escocês. Pois bem, cerca de dois anos depois, o obreiro retornou, já colado no grau de Mestre e com o seu avental de orla vermelha; com ele se apresentou em reunião de sua Loja e foi impedido de ingressar. Ou seja: o único que estava com paramentos escoceses corretos, foi impedido de ingressar em Loja escocesa, por um bando de obreiros com paramentos do Rito de York!

            E mais dois casos podem ser citados, não absurdos como o primeiro, mas esclarecedores. O primeiro: fazendo palestra em Santana do Livramento (RS), na fronteira com o Uruguai, em 1989, constatei a presença --- e chamei a atenção para isso --- de diversos obreiros de Rivera, da Grande Loja do Uruguai, com seus paramentos de orla vermelha. O segundo: falando em Londrina (PR), em 1991, em sessão não litúrgica (sem paramentos), sobre a cor dos aventais e templos escoceses, fui interrompido por um Irmão do Equador, recém chegado, o qual me perguntava, diante disso, qual era a cor usada no Brasil, no Rito Escocês; quando lhe disse que era a azul, ele reagiu com um riso de mofa, que valeu por mil palavras, e, puxando uma maleta, de lá tirou --- e mostrou --- o seu avental de orla vermelha.

             Apesar de todos esses rituais já terem sido mostrados e publicados diversas vezes, sempre existem os que não pesquisam, não estudam, não procuram, mas “acham”. Apenas “acham” que a cor do rito deve ser a azul e ainda inventam que a cor vermelha foi uma criação brasileira do século passado, atribuindo-a a Cairu (Henrique Valladares), que só pontificou na Maçonaria nacional no fim do século XIX, muito depois dos rituais de 1834, 1857 e 1875. Para esses, nada melhor do que “matar a cobra e mostrar o pau”, pois, em termos de rituais ESTRANGEIROS, podem ser citados vários:

1. Ritual do Grau de Mestre Maçom, editado em 1912, em Lisboa, pelo Grande Oriente Lusitano Unido e pelo Supremo Conselho da Maçonaria Portuguesa, ambos reconhecidos mundialmente, na época. Nesse ritual, à página 10, pode-se ler:

INSÍGNIAS - 1o. - Avental branco orlado de carmezim, tendo bordadas no meio as letras M.: B.:, também da mesma côr. --- 2o. - Banda de “moiré” azul orlada de carmezim, lançada do ombro direito para o flanco esquerdo, tendo na parte inferior uma roseta vermelha, da qual pende a jóia formada por um compasso aberto 45 graus, cruzado com um esquadro. A jóia também pode ser um triplo triângulo coroado.

            Além disso, Oliveira Marques, um dos maiores historiadores da Maçonaria, não só de Portugal, como de toda a Europa, publicou, em 1986, uma obra intitulada “Figurinos Maçônicos Oitocentistas – um guia de 1841-1841”, com base em guias maçônicas encontradas no Arquivo Nacional da Torre do Tombo, junto com um texto de um decreto regulamentar de 15 artigos, com a chancela do Supremo Conselho de Portugal, datado do “25º dia da lua de Sivan, do ano da Grande Luz de 5842” (25 de maio de 1842). A obra, que mostra os paramentos dos 33 graus, com as roupas da moda, na época, exibe, no desenho correspondente ao grau de Mestre, o avental de orla vermelha, com as letras M e B.

2. Ritual do Grau de Aprendiz Maçom do REAA (não do Retificado), editado em 1971, pela Grande Loja Nacional Francesa, que é a única Obediência francesa reconhecida em todo o mundo, inclusive, evidentemente, pela G.L.Unida da Inglaterra e pelas Grandes Lojas norte-americanas. Nesse ritual, impresso à rua Christine de Pisan, 12, em Paris, pode-se ler, á página 1 --- Decoration de la Loge --- o seguinte:

“La tenture des parois doit être en principe rouge”. O que significa:

“A tapeçaria (estofo, forro) das paredes deve ser principalmente vermelha”.

Mais adiante, na mesma página, quando aborda o trono e o altar, o ritual especifica:

“Au-dessus du trône est un dais rouge avec franges en or”. O que significa:

“Acima do trono há um dossel vermelho com franjas douradas.

3. A Grande Loja do Chile, em seus Cuadernos Docentes, Primer Grado, edição de 1992, às páginas 50 e 51, do capítulo “El Mandil”, afirma:

“El mandil de piel blanca debe tener um ancho de 35 a 40 centimetros, por 30 a 35 de altura, unido a una cinta también blanca, en el primer grado. Una orla de cinta roja de 3 a 4 centimetros da al mandil de 2º grado el significado del celo y constancia com que el masón prosiegue la senda de su perfeccionamento; y la misma orla y cinta roja con las iniciales M.B., constituirá el de Maestro”.

            Ou seja: “O avental de pele branca deve ter uma largura de 35 a 40 cm., por 30 a 35 de altura, unido a uma cinta também branca, no primeiro grau. Uma orla de fita vermelha de 3 a 4 cm dá, ao avental do 2º grau, o significado do zelo e constância com que o maçom prossegue no caminho do seu aperfeiçoamento; e a mesma orla de fita vermelha, com as iniciais M.B., constituirá o do Mestre”.

            Nota-se, que, para essa Grande Loja, como para algumas outras, até o avental de Companheiro tem a orla vermelha. O Ir.: Léon Zeldiz, atual Sob.: Gr.: Com.: do Supremo Conselho do REAA do Estado de Israel, sabe disso, porque foi iniciado no Chile. E, em carta a mim, na minha qualidade de Grande Representante (Garante de Amizade) da Grande Loja do Estado de Israel, dizia que concordava comigo, inteiramente, que a cor do REAA é a vermelha.

   E me explicava que a situação de Israel era sui-generis, porque, criada pela G.: L.: Unida da Inglaterra e trabalhando só no rito azul de York, foi um custo fazer ela aceitar as três Lojas do REAA; se fosse colocada também a cor vermelha, seria provocar demais, já que a GLUI não aceita o REAA. Então, em Israel, como no Brasil, o rito ficou azulado. Só que lá foi por questão de sobrevivência. E aqui?

4. A Grande Loja da Venezuela, em seu ritual do grau de Aprendiz do REAA, 15a. edição – 1978 (lá não se muda o ritual “n” vezes, como aqui), afirma, à página 5, em Decoracion de la Logia:

“Paredes tapizadas, colgadas o pintadas de rojo. (...) Al Este hay un dosel de cualquier genero encarnado com flecos de oro; debajo, el trono donde se coloca el Presidente; delante del trono un altar en que se pone una escuadra, un compás, la Constitción masónica, una Biblia, una espada”

Ou seja: “Paredes atapetadas, forradas, ou pintadas de vermelho. (...) No Oriente há um dossel ,de qualquer gênero, vermelho, com franjas douradas; sob ele, o trono, onde se coloca o presidente; diante do trono um altar com um esquadro, um compasso, a Constituição maçônica, a Bíblia e uma espada”.

5. E, para finalizar, outra instrução européia, em obra aprovada pelo Supremo Consiglio del 33.: per l’Italia, reconhecido pelos demais Supremos Conselhos do mundo. Trata-se do livro “GLI EMBLEMI ARALDICI DELLA MASSONERIA DI RITO SCOZZESE ANTICO ED ACCETTATO” (Os Emblemas Heráldicos da Maçonaria do Rito Escocês Antigo e Aceito), editado em 1988, por Convivio-Nardini Editore, de Firenze, e que traz o timbre do Supremo Conselho da Itália, para mostrar a procedência oficial. Pois, neste livro, sobre emblemas heráldicos dos 33 graus escoceses, há uma parte complementar que descreve os paramentos e jóias de cada grau. E, no de Mestre Maçom (Maestro Massone), há a seguinte descrição:

“Grembiale bianco foderato e orlato di rosso. Nel mezzo vi sono le lettere M.B. . Il gioiello è un triplice triangolo coronato, attaccato al Cordone bleu con una rosetta rossa”.

Ou seja: “Avental branco forrado e orlado de vermelho. No centro estão as letras M.B. . A jóia é um tríplice triângulo coroado, atado ao Cordão azul por uma roseta vermelha”

Esse é o uso, antigo, em Obediências regulares e reconhecidas.

HISTÓRIA DA FUNDAÇÃO DO GRAU 33° E DO PRIMEIRO SUPREMO CONSELHO DO MUNDO DO R.E.A.A.

            A Maçonaria Operativa tinha somente dois Graus: Aprendiz e Companheiro. Mestre não era Grau e sim uma função que competia ao responsável pela construção. Não tinha quaisquer influências da Alquimia, Cabala, Astrologia, Rosacrucianismo, Ocultismo, enfim, de qualquer segmento esotérico como tal hoje, muitos Maçons pretendem que assim seja. Não tinha Templos, as reuniões, como todos sabem, eram realizadas em tabernas. Durante a reunião de Maçons não se abria qualquer Livro da Lei. Não existia o simbolismo das ferramentas. Os Símbolos eram desenhados no chão com giz ou carvão. Dois Símbolos que já existiam e constam dos Old Charges eram as Colunas que hoje conhecemos como J e B, mas que, naquela época, não portavam no meio de seu corpo as referidas e polêmicas letras que têm e que geram tanta discussão e que também apresentam outros significados simbólicos um tanto diferentes dos que hoje conhecemos.

            O Escocesismo ou Escocismo é caracterizado por uma série de Ritos que nasceram na França a partir do ano 1649 e que tiveram um desenvolvimento bastante peculiar e sincrético, recebendo as mais variadas denominações e influências, quer filosóficas, morais, bíblico-judaicas, herméticas, rosacrucianas, templárias, políticas, religiosas e sociais, além dos modismos das épocas dos cavalheiros e gentis-homens das monarquias e reinados e também da História da Humanidade, tudo isto acontecendo num período bastante transformador de costumes.

            Em 1725 foi criado o Grau de Mestre e em 1738 ele foi acrescentado oficialmente aos dois primeiros Graus e incorporado definitivamente à Ordem. Criaram a lenda de Hiram, a qual sabemos de sobejo não ter compromisso com a realidade histórica ou religiosa e que por sinal ninguém sabe quem foram em realidade seus inventores, mas sabemos que ela levou mais ou menos uns sessenta anos para tomar a redação que hoje conhecemos, bem como suas mensagens ficarem definitivamente consagradas.

            Se o Grau de Mestre já foi um acréscimo dentro da própria Maçonaria simbólica, achar que os Maçons ficariam satisfeitos com ele sendo o último seria muita inocência nossa.

             Enquanto a Maçonaria Inglesa através do seu relacionamento direto com a Igreja Anglicana e com o Estado, permaneceu tradicionalmente ligada à Bíblia, a Maçonaria Francesa numa liberalidade a toda prova, aceitou e adotou uma amálgama de doutrinas de concepções heterogêneas, o que acabou sendo o substrato para o aparecimento dos Altos Graus do Escocesismo ou Escocismo e por continuidade ao Rito Escocês Antigo e Aceito. Se nos ativermos à história do Rito, no início os franceses acompanharam os Modernos das Lojas inglesas, mas começaram a acrescentar progressivamente os Altos Graus. Há quem atribua aos franceses a criação do Terceiro Grau, ou seja o Grau de Mestre.

            Alguns autores atribuem um desenvolvimento cronológico na criação dos Altos Graus que seria assim: seis Graus até 1737, sete Graus até 1747, nove Graus até 1754, dez Graus até 1758, vinte e cinco Graus até 1801 e daí para frente trinta e três Graus. Entretanto esta cronologia é rejeitada por outros. Entretanto a história está aí para nos comprovar, pois como todos os franceses foram acrescentando Graus e mais Graus na Maçonaria no decorrer do século XVIII.

            A causa da criação dos Graus acima dos três primeiros é ainda um tanto obscura e divergente entre os autores. Poderia ser de fundo político, ou por interesses pessoais ou a colação de títulos cavalheirescos e pomposos, os quais alimentariam a vaidade dos nobres, ou ainda razões espirituais ou até jesuíticas, já que o jesuitismo era ligado aos Stuarts, caracterizando assim uma causa política.

Porém com relação às origens aparecem três possibilidades a saber:

a) O famoso discurso do Cavaleiro Ramsay;

b) O Capítulo de Clermont;

c) O Conselho dos Imperadores do Oriente e do Ocidente.

Conforme alguns autores, ainda considerando as origens do Rito, referem-se a sete categorias a saber: 1º) Graus Simbólicos primitivos e universais;

2º) Graus de desenvolvimento dos Graus Simbólicos e universais;

3º) Graus baseados no Iluminismo do Tribunal da Santa Vingança ou Santa Vehme;

4º) Graus judaicos e bíblicos;

5º) Graus Templários;

6º) Graus Alquímicos e Rosacrucianos;

7º) Graus Administrativos e Superiores.

            Entre as lendas do início das origens dos Altos Graus aparece o Cavaleiro de Ramsay (André Michél – 1686-1743), homem erudito, nascido na Escócia, partidário dos Stuarts, protegido do Bispo de Fenelon com ligações em todas as cortes da Europa, ao qual atribui-se ter sido o inspirador da criação dos Graus Superiores e ter ajudado a elaboração dos Graus Simbólicos.

            O seu famoso discurso que foi escrito em 1737, mas que talvez nunca tenha sido lido em qualquer Loja, ou apresentado em qualquer assembléia de Maçons, podendo até ser apócrifo segundo alguns autores, pois acredita-se que haja pelo menos quatro versões do mesmo, foi distribuído fartamente em todas as Lojas da França e países vizinhos. Neste documento Ramsay faz apologia que a Maçonaria seria originária dos Templários, o que não é verdade, tece comentários pela primeira vez enfatizando hierarquia na Ordem, proclama o ideal maçônico na Fraternidade e num mundo sem fronteiras, tentando impingir uma falsa antigüidade e nobreza à Maçonaria.

            Fez uma proposta às Lojas inglesas para acrescentarem mais três Graus aos já existentes (Mestre Escocês, Noviço e Cavaleiro do Templo). A Maçonaria inglesa rejeitou. Estes três Graus teriam sido, segundo Ragon, criados por Ramsay.

            Fez uma proposta às Lojas francesas para que se acrescentassem mais sete Graus Suplementares. Também não foi aceito. Mas de qualquer forma a partir daí começaram as introduções templárias e rosacrucianas e os Altos Graus começaram a aparecer. Muitos autores não aceitam este fato, rejeitam a participação de Ramsay. Entretanto, outros, como Ragon, a apóiam.

             Segundo Paul Naudon, o fato mais importante acontecido após o polêmico discurso de Ramsay, foi a criação do Capítulo de Clermont pelo Cavaleiro de Bonneville em 1754. Os Irmãos que criaram este Corpo pretendiam continuar os mesmos princípios da Loja de Saint-Germian-en-Laye, fundada muito tempo antes, ou seja, praticar os Altos Graus, criando sete Graus e opondo-se à política da Grande Loja da França, a qual seria posteriormente dissolvida em 24.12.1772.

            O Capitulo de Clermont teve uma duração efêmera, sua existência foi muito curta, mas valeu pelas conseqüências, pois uma das suas ramificações foi a fundadora do Conselho dos Imperadores do Oriente do Ocidente, Grande e Soberana Loja de Jerusalém, que organizou um Rito de vinte e cinco Graus chamado Rito de Perfeição ou de Heredom. Seus membros, conhecedores de várias tradições místicas e gnósticas antigas, trouxeram para este Corpo Maçônico as influências templárias, rosacrucianas e egípcias, além de se dizerem herdeiros dos Ritos de Clermont e das correntes escocesas de Kilwinning e Heredom. Estava assim decretada a influência esotérica na Ordem. Em 1762, sob os auspícios deste Conselho, foram publicados os Regulamentos e Constituição da Maçonaria de Perfeição, elaborados por nove comissários (Constituição de Bordeaux em 21.9.1762).

            A fundação destas potências mencionadas não nos dão conta nem idéia do processo político-maçônico dos bastidores, das desavenças internas, das histórias e estórias relatadas, das perseguições entre os Irmãos, chegando-se até a agressões, dos interesses pessoais, das vaidades de tal forma que quando analisamos os fatos chegamos à conclusão que muita coisa que acontece no presente já aconteceu no passado. Os homens continuam os mesmos. A Maçonaria mudou mas os homens não mudaram...

            Em 1761 o Conselho de Imperadores teria fornecido através do Irmão Chaillon de Joinville, substituto Geral da Ordem e mais oito Irmãos da alta hierarquia que também teriam assinado o documento, uma patente constitucional de Grande Inspetor do Rito de Perfeição ao Irmão Etienne ou Stephen Morin, autorizando-o a estabelecer e perpetuar a Sublime Maçonaria em todas as partes do mundo e investindo-o de poderes de sagrar novos Inspetores. 

Chegando à Colônia francesa de São Domingos (hoje Haiti), no mesmo ano pôs-se a trabalhar. Há fortes suspeitas de que este documento seja fraudado. Também segundo muitos autores, Etienne teria comercializado estes Altos Graus. Na realidade, o Rito de Perfeição ficou muito mal trabalhado durante mais ou menos trinta anos. Foi esquecido o seu conteúdo esotérico e sua ritualística muito mal usada. Mas de qualquer forma os americanos aceitaram muito bem o Rito, e ainda acharam que os vinte e cinco Graus eram insuficientes para abranger toda a iniciática maçônica.

            Morin teria entregue certificados ou carta patente a outros Irmãos e um deles foi um Irmão de nome Henry A. Francken, também de origem judaica, que teria estabelecido o Rito em Nova York. Outro grupo introduziu o Rito em Charleston em 1783.

            Na mesma colônia francesa São Domingos (Haiti) alguns anos mais tarde apareceram os Maçons, o Conde Alexandre François Auguste de Grasse Tilly e o seu sogro Jean Baptiste Delahogue, os quais posteriormente em 1793 mudaram-se para Charleston. Grasse Tilly já tinha pensado em fundar um Supremo Conselho nesta cidade. Lá encontraram mais dois Maçons: Frederik Dalcho e John Mitchel. Existem autores que afirmam que foi Dalcho quem teve a idéia de criar mais oito Graus, e existem autores que sustentam que o último Grau foi Grasse Tilly quem criou.

            Assim começou um trabalho de poucos Irmãos sem serem conhecidos nos Estados Unidos e especialmente no mundo maçônico da Europa, e que culminou com a criação de um Rito, calcado em cima do Rito de Heredom ou de Perfeição. Estes quatro Irmãos e mais seis fundaram o primeiro Supremo Conselho do Mundo em 31.5.1801 na cidade de Charleston. Só que a partir daí surgiu uma das maiores balelas do Rito nascente que só se tornaria conhecida a partir de 4 de dezembro de 1802, quando foi expedida uma circular comunicando o que havia acontecido e divulgando o sistema de 33 Graus e atribuindo que a sua organização teria sido feita em 1786 por Frederico II da Prússia.

            A versão dada pelo Supremo Conselho da França refere que Carlos Stuart, filho de Jaime III, o qual sendo considerado como chefe de toda a Maçonaria, conferiu o título de Grão-Mestre a Frederico II, o Grande, rei da Prússia (1712-1786) nomeando-o seu sucessor e como tal também chefe dos Altos Graus. Em 1782 ele confirmava as Constituições e Regulamentos de Bordeaux. E daí a quatro anos ele transferia seus poderes a um Conselho de Inspetores Gerais e, ao mesmo tempo, acrescentava mais oito Graus, e em 1786 publicava sua famosa Constituição.

             Entretanto esta versão não tem o menor reconhecimento entre os bons autores maçônicos e entre eles Findel, Ragon, Lindsay Rebold, Thory Clavel e tantos outros. Um deles, Rebold, afirma que Frederico foi Iniciado em 15.8.1738 em Brunswich e que em 1744 a Loja "Três Globos" de Berlim, fundada por artistas franceses, foi por ele elevada à categoria de Grande Loja, da qual foi aclamado como Grão-Mestre, exercendo mandato até 1747. Desta época para frente ele afastou-se da Ordem, e quando apareceram os Altos Graus ele não só não os aprovou, como os combateu. Eles foram introduzidos na Alemanha pelo Marques de Bernez.

Então como aconteceu e por que esta grande mentira?

             Simplesmente, porque o grupo de dez Maçons que fundou um novo Rito, não tinha o respaldo histórico e credibilidade, para se impor perante o mundo maçônico da época, então foi mais estratégico e cômodo atribuir a fundação, em 1786, do Rito Escocês Antigo e Aceito a Frederico da Prússia, imputando, inclusive, ao Rito uma origem anterior: Frederico gozava de boa reputação política, simpático à causa da separação dos Estados Unidos da Inglaterra, inclusive enviando soldados à América para combater as forças inglesas. Só que em 1801, Frederico já tinha falecido. O interessante é que até a presente data, muitos Rituais dos Graus Superiores mencionam esta balela.

Estava assim fundado no dia 31.5.1801 nos Estados Unidos, o Rito Escocês Antigo e Aceito, calcado numa mentira histórica, aceita ainda hoje em dia como se fora uma verdade intocável.


DOCUMENTOS BÁSICOS DO ESCOCESISMO OU ESCOCISMO

a) O Discurso de Ramsay em 1738;

b) Constituição de 1762, organizada pelo Conselho de Imperadores do Oriente e do Ocidente;

c) A Patente de Stefhen ou Etienne Morin emitida em 27.8.1761, assinada pelo Irmão Chailon de Joinville e demais autoridades mandatárias dos Graus Eminentes;

d) Os novos Institutos Secretos e Fundamentais que foram atribuídos de forma inverídica a Frederico II e que, apesar de datarem de 1786, foram elaborados, posteriormente;

e) Constituições, Estatutos e Regulamentos para o Governo do Supremo Conselho dos Inspetores Gerais também levando autoria de Frederico II indevidamente;

f) As resoluções do Congresso de Lausane em 1875.

BIBLIOGRAFIA

1. CASTELLANI, José. Rito Escocês Antigo e Aceito – História, Doutrina e Prática.

2. PROBER, Kurt. Fredericus II, o Grande e a Maçonaria.